sexta-feira, 27 de abril de 2012

A intenção de cantar - Pe. Zezinho, scj

 Pe. Zezinho, scj

O que é uma canção? Mais precisamente, o que é uma canção religiosa? É catequese pela arte. Um autor religioso concebe uma idéia e trabalha em cima dela que ele deseja que se torne mensagem de fé. Compõe uma letra, uma melodia, dá-lhe um ritmo, um título e, às vezes, um arranjo. Esse conjunto é a sua obra. Alguém lhe pede para interpretar aquela canção e ele a cede, na esperança de que o intérprete não mude nem a melodia, nem o título, nem a letra, nem o ritmo e nem faça arranjos que descaracterizem a canção. Infelizmente, nem sempre o intérprete respeita a obra do autor. Faz como o entregador de pizza que muda o gosto e os ingredientes do alimento que entrega.

Canção é como filho! Quem já compôs canções sabe disso. Cada uma tem um rosto. Você não entregaria seu filho para uma pessoa mudar o rosto deste filho ou desta filha. Antes, espera que cuidem dele e o apresentem numa festa sem descaracterizá-lo. Afinal é seu filho. O outro pode até vesti-lo com outras roupas, mas não pode descaracterizá-lo. Quando o intérprete interfere na letra, mudando-a, ou acrescentando palavras, sem que as apresente previamente ao autor; quando interfere no ritmo e às vezes na harmonia; quando a canta em público sem dizer quem é o autor, o intérprete ele está a interferir numa obra. Torna-se parceiro sem que o autor tenha aceitado a co-autoria. Às vezes o faz sem má intenção, deturpando uma obra de arte. É como pegar um quadro de Picasso e acrescentar-lhe algumas pinceladas; ou como pegar uma peça de Shakespeare e acrescentar-lhe textos.

Por menos importante que seja a canção, ela pertence ao autor e não ao intérprete. Se alguma canção foi descaracterizada e o autor não aceita, o que deve fazer o intérprete? Ficar zangado, retirar do cd e deixar as pessoas pensarem que o autor é intransigente e intolerante, ou aceitar humildemente regravá-la de maneira que o autor admita e aceite. Alguns cantores me fizeram esta gentileza e sou-lhes grato por isso. Outros tiraram a canção do Cd e não aceitaram modificá-la.

O que é pior? Um autor intolerante que não gosta que mexam na sua obra ou um intérprete demasiadamente liberal que gosta de modificar a obra dos outros? O que é interpretar uma canção? É descaracterizá-la, ou cantá-la como foi composta só que com vida, emoção e sentimento? O bom cantor, em geral cantor canta melhor do que o autor. Seu dom é por sentimento e arte numa obra sem modificá-la. A arte do intérprete está e não mudar uma canção e, assim mesmo, torná-la bonita.

Para interpretar bem uma canção não é preciso mudar a letra nem o ritmo e nem a melodia. Até que ponto se pode mexer na letra, na melodia e no ritmo do Hino Nacional, de Noite Feliz, de Luar do Sertão, de Casinha Branca? Corre pelo país uma noção errônea do que seja interpretar. Interpretar é dar sentimento e não necessariamente modificar. Digo isso como autor que já ouviu suas canções maravilhosamente interpretadas por cantores que não a mudaram, mas a encheram de sentimento e de vida. Mas já vi algumas modificadas de tal maneira que se tornaram irreconhecíveis. Não foram criadas dessa forma nem para isso.

Um cantor exigente corre sempre o risco de não ter sua canção interpretada nem divulgada por ninguém. Talvez ele queira correr esse risco! Mas o interprete que modifica demais uma canção, também corre o risco de não ter autor que lhe permita cantar alguma canção de sucesso. Uma coisa é certa: o autor tem o direito de não permitir que interfiram na sua obra. Ao interprete cabe apenas o direito de interpretar sem modificar. Se conseguir, terá mostrado do quanto é capaz. Compre três cd's com a ópera "Carmen" de Bizet, interpretada por três cantores diferentes. Ouça-os e tire suas conclusões!

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