EUCARISTIA: da
comunhão de pão à comunhão de vida
Lucas 9,11b-17
Naquele tempo:
11b Jesus acolheu as multidões, falava-lhes sobre o Reino de Deus
e curava todos os que precisavam.
12 A tarde vinha chegando. Os doze apóstolos aproximaram-se de Jesus e disseram:
'Despede a multidão, para que possa ir aos povoados e campos vizinhos
procurar hospedagem e comida, pois estamos num lugar deserto.'
13 Mas Jesus disse: 'Dai-lhes vós mesmos de comer.'
Eles responderam: 'Só temos cinco pães e dois peixes.
A não ser que fôssemos comprar comida para toda essa gente.'
14 Estavam ali mais ou menos cinco mil homens.
Mas Jesus disse aos discípulos: 'Mandai o povo sentar-se em grupos de cinqüenta.'
15 Os discípulos assim fizeram, e todos se sentaram.
16 Então Jesus tomou os cinco pães e os dois peixes,
elevou os olhos para o céu, abençoou-os, partiu-os
e os deu aos discípulos para distribuí-los à multidão.
17 Todos comeram e ficaram satisfeitos.
E ainda foram recolhidos doze cestos dos pedaços que sobraram.
Reflexão
A Solenidade do Corpo e Sangue de
Cristo entrou na liturgia da Igreja em 1247, em meio a polêmicas e
dúvidas sobre a presença real de Jesus na Eucaristia.
Desde o início, a solenidade é marcada por grandes concentrações populares e
procissões majestosas pelas ruas. O Concílio Ecumênico Vaticano II deu-lhe novo
significado, ligando-a estreitamente à Páscoa do Senhor, o mistério
eucarístico por excelência. A Eucaristia como memória
da Páscoa – a ceia da nova e eterna aliança -, centro
da vida e da missão de Jesus entre nós. A festa de Corpus Christi
recorda que o mistério pascal está todo presente na Celebração
Eucarística.
Celebrar a
Eucaristia é renovar a aliança selada no sangue do
Cordeiro, que se entregou por nós radicalmente como servo. Participando da
Celebração Eucarística, somos convidados a fazer de nossa vida um
serviço e dom gratuito, para o louvor de Deus e a libertação da humanidade. Uma
oferenda perfeita com Cristo, pela ação amorosa e sempre fecunda do Espírito
Santo. E, assim, tornar autêntica a afirmação de nossa fé: ‘Ele está no meio
de nós!’.
A
Eucaristia é a aliança eterna e definitiva de Deus
conosco, selada pelo sacrifício único de Jesus Cristo. Seu gesto de amor e
entrega é para sempre e permanece atual, pela liturgia, em todo tempo e no
decorrer da história da salvação da humanidade.
No pão e no vinho da última
refeição de Jesus, faz-se presente antecipado o dom da sua vida entregue até a
morte sangrenta na cruz. ‘A entrega de Jesus, sua morte-ressurreição, que
aconteceram uma única vez (Hb 10,10-18), tornam-se presentes para nós pela ação
litúrgica, ou seja, toda vez que fazemos memória destes fatos e de nossa
salvação, anunciamos a morte do Senhor, até que Ele venha (1Cor 11,26). Não se
trata de uma repetição, mas de uma atualização’. O sacrifício é um
só.
Somos redimidos por um amor
sacrificado, um amor que doou corpo e sangue, isto é, doou a vida. Não é o
sangue por si mesmo que salva. O que salva são o amor e a fidelidade que levaram
Jesus a enfrentar morte cruel e sangrenta. Depois da sua morte, não há outro
sacrifício de sangue na nova aliança, pois não é o sangue em si que importa, mas
a entrega, o amor de quem o derramou, e este é válido para sempre.
Unindo-nos ao amor de Jesus,
entregamos, no momento da Celebração Eucarística, o
nosso corpo e sangue, toda nossa vida a serviço dos irmãos. Assim, nos tornamos
‘uma oferenda perfeita’ com Cristo e em Cristo.
Se, na verdade, desejamos
participar da mesa eucarística, agora e no banquete celeste, somos convidados a
participar de seu serviço gratuito e assumir em nossa carne a sua doação
radical.
‘Se queres honrar o Corpo de
Cristo, não o desprezes quando ele está nu. Não o honres assim, na Igreja, com
tecidos de seda, enquanto o deixas fora, sofrendo frio e carente de roupa. Com
efeito, o mesmo que disse: ‘Isto é o meu corpo’ e que
realizou, ao anunciar, também disse: ‘Viste-me com fome e não me deste
comida (...)’. Começa por alimentar os famintos e, com o que te sobra,
ornamentarás o altar’ (Catequese de São João Crisóstomo)’” (cf. Roteiros
Homiléticos da CNBB n. 22, pp. 24-30).
Certa vez uma menina de apenas seis anos, vendo o pai
arrumar as alfaias para a Missa, subiu num banquinho e beijou a hóstia sobre a
patena. O pai lhe disse: “Sua Bobinha. Por que beija esta hóstia? Jesus nem
está aí!...” A menina respondeu: “Eu sei que Jesus ainda não está aí,
mas quando chegar, encontrará meu beijo!...” Somos convidados a aprender da
sabedoria desta menina, tornando-nos capazes de compreender e adorar Jesus
Sacramentado, remetendo tamanho mistério à maturidade de nossa fé, tornando-nos
também, capazes de beijar Jesus na pessoa do Outro. Sim, porque cada vez que
comungamos Jesus Eucarístico, tornamo-nos seu Sacrário. Gosto de pensar, que
acabamos sendo um porta-jóias, que leva em seu interior a mais preciosa jóia que
alguém possa receber. Que a Eucaristia nos capacite
cada vez mais ao amor com sabor
divino!
No dia de hoje, ao participarmos da Santa Missa
e sairmos às ruas em Procissão, façamo-lo com fé, com amor, com devoção, com
dignidade, em espírito de adoração. Sejamos esmeradamente cuidadosos com o Corpo
e o Sangue de Deus. Somente se soubermos cuidar o Corpo Eucarístico do Senhor,
cuidaremos da maneira que convém do Corpo Místico de Cristo, que é a Igreja, e
dos nossos irmãos numa verdadeira fraternidade e solidariedade. Dediquemos ao
culto eucarístico os nossos melhores esforços, os melhores ornamentos, os
melhores cálices, os melhores cantos. Tudo para Deus!
Como outrora, Jesus nos recebe e nos fala do
Reino, cura as nossas enfermidades e nos dá de comer (cfr. Lc 9,11-17). No
Sacramento da Eucaristia podemos experimentar essa realidade: Deus está não
somente perto de nós, mas dentro de nós. “O Senhor esteja convosco” – nos diz o
sacerdote em cada celebração da Eucaristia. Agradecemos a Deus pela sua
presença, pelo seu amor, pela sua misericórdia, pela sua amizade?
Recordemos: no momento em que o sacerdote
pronuncia as palavras da consagração sobre o pão e o vinho, esses elementos se
convertem no Corpo e no Sangue adoráveis de Jesus Cristo. Depois da consagração
já não há mais pão, há somente o Corpo de Cristo; não há mais vinho, mas tão
somente o Sangue de Cristo. Junto com Jesus, se fazem presentes o Pai e o
Espírito Santo porque onde está uma Pessoa da Santíssima Trindade estão as
outras duas. Na espécie do pão está todo o Cristo, na do vinho também.
Em cada fragmento das espécies do pão e em cada gota da espécie do vinho está
Cristo inteiro. Quem comunga somente a espécie do pão, recebe também o seu
Sangue e toda a realidade que comporta esse sacramento; quem recebe somente a
espécie do vinho, recebe também todo o Cristo. Ao partir-se a hóstia, não
partimos a Cristo, pois não se trata de uma presença física de Cristo, mas de
uma presença misteriosa, que a teologia chama de presença substancial.
Diante da presença de Jesus Cristo, sejamos
educados, corteses, elegantes. Ao entrar na igreja, não nos esqueçamos de usar
um pouco da água benta disposta nas paróquias para esse fim, a água benta nos
lembra o nosso batismo e nos livra das ciladas do demônio. Em seguida,
procuremos onde está o Sacrário e façamos uma genuflexão pausada diante do nosso
Deus; que seja uma genuflexão bem feita, isto é, dobrando joelho direito até o
chão (não é jeitoso benzer-se ao mesmo tempo, primeiro se faz a genuflexão e
depois se benze, ou ao contrário). Não conversemos dentro da Igreja, caso seja
necessário falar algo com alguém, façamo-lo em voz baixa. É de boa educação
chegar uns minutinhos antes na Missa, dessa maneira manifestamos que nós
esperamos a Jesus. Escutemos com atenção as leituras. Às palavras da
consagração, está previsto que nos ajoelhemos e não que fiquemos de pé (a não
ser que haja alguma causa justa; neste caso, pelo menos façamos uma “inclinação
profunda enquanto o sacerdote faz genuflexão após a consagração”); caso se
receba a comunhão de pé, é bom fazer alguma reverência antes de recebê-la.
Depois da comunhão, não nos esqueçamos de dar graças a Deus, normalmente se
recomenda pelo menos uns 10 minutinhos em oração depois de comungar. Também
seria muito bom se nos acostumássemos a fazer visitas a Jesus no Sacrário, pois
frequentemente o Senhor está muito sozinho nos Sacrários das nossas igrejas e,
além do mais, ele está aí por você e por mim. Enfim, tenho certeza que o amor a
Deus que está em nossos corações nos sugerirá outros detalhes de carinho para
com Jesus na Santíssima Eucaristia. Quem ama é criativo!
Reflexão 3:
“Jesus tomou os cinco pães e os dois peixes, elevou
os olhos ao céu, abençoou-os, partiu-os..” (Lc. 9)
Comer e beber com outras pessoas é a coisa mais
simples e importante que podemos fazer para reforçar nossa humanidade.
Comer é uma experiência humana e espiritual; sentar-se com outras
pessoas em torno de uma mesa é sagrado. Se por acaso pudermos ter
alguns desconhecidos à mesa, melhor ainda. O alimento possibilita a conversa – é
sinal visível do Amor. Lembremo-nos, é preciso tempo: “fast food não nos faz
bem!”
Tempo para saborear e sorver, deliciar-se e
conversar... Tempo para uma longa e lenta digestão de tudo o que é bom. O
primeiro ingrediente é sempre o amor. Em intervalos regulares, é necessário
festejar. É uma dessas coisas que não se questiona. Sobreviver é animal;
festejar é humano; ser um “animal festivo” é ser divinamente humano. Deus adora
festejar.
Cada vez que comemos e bebemos, comungamos com o
outro, com a terra, com todo o Universo. O pão é vida concentrada; vida em forma
de alimento. No repartir do Pão palpita a vida que transcende as fronteiras
existenciais. Cada vez que comemos, o fazemos com profunda gratidão e veneração
ao que recebemos, e compaixão pelos que não podem comer.Cada bocado que mastigamos é um gesto
sagrado: comungamos com o Todo, o Ser, a Vida. O que importa é que seja
fruto da terra e do trabalho, sacramento da vida e do mundo novo. Comungamos com
a grande Comunhão ou com o Mistério de Deus. Viver é com-viver.
É preciso ir a fundo no profundo significado e
sentido desse gesto: partir o pão é o símbolo ancestral que nos revela as
entranhas da humanidade, ou seja, compartilhar a necessidade.
Isso acontece em cada refeição, e a Eucaristia não
é nada mais do que isso, porque não pode haver nada maior que uma simples
refeição. O simples é o pleno. O cotidiano e natural é o mais sagrado.
Jesus de Nazaré sonhava e anunciava outro mundo possível e o chamava
“Reino de Deus”. E, para explicar como seria esse outro mundo, já neste
mundo, não lhe ocorreu coisa melhor que organizar uma alegre refeição no campo:
cada um levou e compartilhou o pouco que tinha; todos se saciaram e ainda sobrou
muito. O pão nas mãos de Jesus era pão para ser partido, repartido e
compartilhado.
Jesus anunciava o “Reino de Deus” como uma
grande mesa com abundante pão e sem nenhum excluído. Sua religião é a
religião da refeição; na verdade Jesus rompeu com a religião e com tudo aquilo
que impedia que todos comessem juntos, que impunha jejuns, que declarava impuros
alguns alimentos e proibia compartilhar a mesa com os chamados pecadores, que
quase sempre eram os pobres.
Alguém teve a ousadia de afirmar que mataram Jesus
por seu modo de comer; em suas refeições escandalosas e provocativas Ele anulava
as fronteiras entre santos e pecadores, puro e impuro, sagrado e profano. Algo
intolerável. Os dirigentes religiosos e as “pessoas de bem” o chamavam de
“comilão e beberrão, amigo dos pecadores”.
Segundo os relatos dos Evangelhos, durante sua vida
pública, Jesus transitou por muitas refeições, propôs a grande mesa da inclusão
e, para culminar, organizou com seus amigos mais próximos uma ceia de despedida
e de esperança. Ali, ao partir o pão e passar o cálice, pediu que se
recordasse dele toda vez que comessem ou bebessem juntos, reavivando a esperança
de construir o mundo que todos esperavam. Eles se transfigurariam e o
mundo se transformaria em Comunhão toda vez que este gesto fosse repetido.
Assim fizeram seus seguidores:
após a Ressurreição Jesus foi “reconhecido ao partir o pão”; foi
reconhecido não porque estava no templo ou ensinava na sinagoga, mas porque
partia o pão. Jesus fez do universo seu corpo e se faz pão para
nós.
Por isso, no primeiro dia da semana, reuniam-se
todos nas casas, oravam juntos, recordavam a mensagem de Jesus, comiam o pão,
bebiam o vinho e a Vida ressuscitava. A isso chamavam, ‘ceia do
Senhor” ou “fração do pão”. Tudo era muito simples e
despojado.
Séculos depois, a simples refeição foi se
complicando. A casa se converteu em templo, a refeição em “sacrifício”, a mesa
em altar, o convite em obrigação, a partilha em exclusão... A festa de
“Corpus Christi” pode ser ocasião propícia para voltarmos ao
mais simples e pleno, para além dos cânones, rubricas, pompas e indumentárias
que não tem nada a vez com Jesus. Basta nos reunir em um lugar qualquer, para
recordar Jesus, compartilhar sua palavra, tomar o pão e o vinho, ressuscitar a
esperança e alimentar o sonho do Reino. Essa é a Missa verdadeira, a
verdadeira missão.
A transformação das relações humanas se dá através
do partir o pão e do passar o cálice de vinho; como o pão é um, comer desse pão
nos faz todos um. A Eucaristia faz de todos nós Corpo de
Cristo. Daí o interesse da primitiva Igreja em que na Eucaristia
comungassem todos do mesmo pão partido, com a finalidade de fazer visível essa
unidade de todos. Ninguém ceia sozinho. Há um partir, um distribuir, mãos que se
tocam, olhares que se encontram. E, em tudo isto, sensação como se fosse a de
uma “conspiração”. Conspirar,
com-inspirar, respirar com alguém, juntos. Conspiradores: respiram o mesmo ar. Jesus e os
discípulos, comendo o Pão e bebendo o Vinho respiram o mesmo ar, o mesmo sonho,
a mesma utopia do Reino.
É assim a comunidade dos cristãos, a Igreja:
juntos, conspirando, mãos dadas, comem o pão, bebem o vinho e sentem uma
saudade/esperança sem fim...
Tomar o pão e o vinho da Eucaristia é fazer memória
de uma presença que nos compromete.
Discípulos de Jesus somos quando aprendemos a partir o pão. Reconhecemos os cristãos hoje quando partem o pão e não o armazenam. O pão armazenado, como o maná no deserto, se corrompe, apodrece. Compartilhar significa não “monopolizar”, não permitir que haja necessitados entre nós. O pão partido é a vida compartilhada: meios, tempo, qualidades.
O cristão, além disso, compartilha seus ideais, seu entusiasmo, seu ânimo, sua fé, sua esperança. Também hoje Jesus precisa de nossas mãos para multiplicar os grãos; precisa de nossas mãos para triturar esses grãos, amassar a farinha e fazer o pão. E precisa de nosso coração para que o pão seja repartido.
O pão sem coração é pão “monopolizado”. Pão indigesto, que engorda o egoísmo. O pão sem coração gera divisões e conflitos. Quantas guerras fraticidas provoca o pão sem coração! Deus precisa de nosso coração para que o pão leve o sinal da fraternidade, seja vitamina de solidariedade, alimento de comunhão, energia de vida.
Discípulos de Jesus somos quando aprendemos a partir o pão. Reconhecemos os cristãos hoje quando partem o pão e não o armazenam. O pão armazenado, como o maná no deserto, se corrompe, apodrece. Compartilhar significa não “monopolizar”, não permitir que haja necessitados entre nós. O pão partido é a vida compartilhada: meios, tempo, qualidades.
O cristão, além disso, compartilha seus ideais, seu entusiasmo, seu ânimo, sua fé, sua esperança. Também hoje Jesus precisa de nossas mãos para multiplicar os grãos; precisa de nossas mãos para triturar esses grãos, amassar a farinha e fazer o pão. E precisa de nosso coração para que o pão seja repartido.
O pão sem coração é pão “monopolizado”. Pão indigesto, que engorda o egoísmo. O pão sem coração gera divisões e conflitos. Quantas guerras fraticidas provoca o pão sem coração! Deus precisa de nosso coração para que o pão leve o sinal da fraternidade, seja vitamina de solidariedade, alimento de comunhão, energia de vida.
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